Costumava resolver equações facilmente

 Costumava resolver equações facilmente

Linda Pastan, poeta.

Conheci-a há uns bons anos. Quinze talvez. Ao tempo, eu andava interessado em poemas que reflectissem uma relação entre poesia e matemática, fosse na forma ou no conteúdo.

Foi um tempo estranho para mim. Ganhei horas a navegar na net. Viagens que não me desiludiram.

De Linda Pastan encontrei, se os meus arquivos não se degradaram entretanto, dois poemas.

Álgebra* cujo começo, na minha tradução, é

Costumava resolver equações facilmente.
Se o comboio A saísse de Sioux Falls
às nove, deslocando-se
a uma velocidade constante,
eu sabia quando ia encontrar o comboio B.
Hoje interrogo-me se os comboios não chocarão
ou, alternativamente, visualizo pernas e braços nus
pelas janelas das carruagens-cama, cada uma
uma pequena vinheta do desejo.

e

Aula de aritmética: Infinito ** que começava, de novo em tradução minha,

Imaginem um desfile de números: o 1
a sentinela, à frente;
o 2 dependente e monógamo;
o 3 aquele homem estranho, aquele 1 a mais
sempre a tentar alinhar.
Os números subtraem-se,
Adicionados ficam pelo caminho.

Depois houve, naturalmente, outros poemas, outras leituras e outras traduções.

Recentemente, com a atribuição do Nobel a uma poeta norte-americana que eu praticamente desconhecia, voltei a lembrar-me de Linda Pasta, de como gosto da sua poesia. Dei, ao mesmo tempo, conta de um pormenor curioso no seu percurso biográfico:


There’s a popular story about Linda Pastan: she won her first poetry prize as a senior at Radcliffe in the fifties, and the runner-up was one Sylvia Plath. It was an auspicious start for Pastan, even if she had never heard of Plath at the time. She’s gone on to publish fourteen books, amassing a host of accolades along the way. Her latest collection, Insomnia, appeared last fall. Her poems have appeared in The Paris Review since 1987; the most recent, “The Collected Poems,” was in the Fall 2015 issue.

(De  The Looming Dark: An Interview with Linda Pastan, by Alex DuebenJanuary 6, 2016)

Escolhi 3 poemas*** para publicar nesta ocasião.

Instruções

Deves embalar a dor nos teus braços
até adormecer, depois deixá-la

num quarto às escuras
e sair de mansinho.

Por instantes sentirás
o vazio da tranquilidade.

Mas no quarto ao lado
a tua dor já está a mexer-se.

Em breve
chamará por ti.

*


Véspera de ano novo

O meu cão está a tomar Prozac –
a ansiedade da separação –

e o filho do meu filho, não sendo já criança,
vai sair de casa.

A terra como um belo fruto redondo
deixada fora do frigorífico

está a começar a apodrecer.
Até a minha solidão se sente só.

O champanhe desta noite não é nada
a não ser efervescência – os copos vazios.

E o cão ainda uiva
como se soubesse

que o relógio tem sido sempre
o inimigo.


E um, finalmente, no espírito da quadra em que este texto foi elaborado:


Natal

Como um único
adorno,

o cardeal vermelho
num pinheiro

lá fora
perto da janela

é o nosso
enfeite

até chegar
a neve.


*Aparas de Lápis, uma antologia de poemas matemáticos,
ISBN: 978-989-20-0711-3, Coimbra, 2007.

**x2 – y2, uma antologia de poemas matemáticos,
ISBN: 978-989-95588-5-4, Coimbra, 2010.

***que surgem em Estes anos a desaparecerem, publicado por Douda Correia, posteriormente a este pequeno perfil ter sido esboçado.


Francisco José Craveiro de Carvalho (poeta e tradutor; é professor jubilado de matemática)

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Francisco Carvalho

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