Mea Culpa?

 Mea Culpa?

Muitos tinham a esperança de que o presidente brasileiro estivesse indo na mesma linha de Trump: ladeira abaixo empurrado pela crise sanitária global. Mas uma pesquisa recente pareceu mostrar exatamente o contrário.

Segundo dados do Datafolha,  52% dos entrevistados consideram que o presidente Bolsonaro não tem nenhuma responsabilidade sobre as mortes provocadas pela Covid-19. É claro, a epidemia trata-se de uma fatalidade. O governo brasileiro, contudo, fez o menos que podia para mitigar o problema. Até hoje, com quase um ano dos primeiros sinais do coronavírus, não há no Brasil um plano de combate à epidemia. Enquanto alguns vizinhos da América Latina, como Argentina e Chile, devem começar as vacinações ainda esse ano, por aqui, não há sequer muita certeza de se teremos vacinas ou sequer seringas.

Um olhar mais cuidadoso sobre os dados do Datafolha, no entanto, pode revelar algo mais sobre a popularidade do presidente e sobre a percepção das políticas públicas. Mesmo que 52% considerem que Bolsonaro não tenha culpa pelas mortes, outros 42% consideram que o governo vem conduzindo a crise sanitária de forma ruim ou péssima. Números que parecem contraditórios. O que poderia explicá-los?

Estudos no âmbito da psicologia vêm sugerindo, já há alguns anos, que os seres humanos têm a tendência de sentirem a culpa pelos erros dos seus. Em outros termos, temos uma propensão a nos sentirmos culpados quando algo que consideramos moralmente condenável é praticado por alguém que identificamos como sendo do nosso grupo, como sendo “um dos nossos”.

Essa tendência poderia ser uma hipótese para explicar a contradição aparente da pesquisa. As pessoas entendem sim que a gestão do coronavírus foi inadequada, mas o que talvez elas tenham dificuldade de assumir é a culpa de quem eles julgam ser um dos seus. Não se desconhece a culpa de Bolsonaro. No íntimo, se sabe que a culpa é dele. Mas assumir essa culpa é como assumir a culpa de um camarada, ou pior, é como assumir a própria culpa.

Outros dados vão na linha dessa hipótese. As pesquisas de opinião mais recentes mostram que a popularidade do presidente continua em alta. Ou seja, não é errado dizer que muitos ainda se identificam com Bolsonaro. O que resta saber é o quanto isso irá durar.

Em primeiro lugar, a crise sanitária, que há cerca de um mês dava indícios de arrefecimento, passa a atingir novamente níveis alarmantes. Algumas localidades que voltavam aos poucos à vida normal, passaram a se fechar e a considerar medidas mais duras de contenção da circulação de pessoas. Em segundo lugar, uma bomba parece esperar o governo neste novo ano. Com o fim dos pacotes de renda emergencial, alguns analistas calculam que 13 milhões de brasileiros podem ser jogados na extrema pobreza, fora muitos outros que perderão renda em patamares diferentes.

Diante de tudo isso, será que a camaradagem com Bolsonaro resistirá à dura realidade que se avizinha?

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Renê Forster

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